Os atores foram os primeiros a reclamar da meia entrada para estudantes. Nei Latorraca disparou, há pouco mais de um mês, durante reportagem sobre a falsificação de carteirinhas de estudantes: "Eu não sou meio ator e não faço meio espetáculo, então não há razão para meia entrada". O respeitado ator foi seguido por Paulo Autran e muitos produtores.
A discussão é maior no Rio de Janeiro e em São Paulo, onde o preço dos ingressos de espetáculos teatrais, musicais e cinemas é bem mais alto do que os praticados em nossa região. E onde comprar uma carteira de estudante falsa via internet, em poucos minutos, é muito fácil.
Em Santa Catarina, os estudantes querem é a meia passagem. Em Joinville uma professora foi denunciada pela empresa de ônibus por dar seu passe para a própria filha, e teve que responder a processo administrativo pela cessão indevida desse benefício.
No Brasil da corrupção passiva e ativa em vários órgãos públicos e empresas privadas, especialmente os que fazem obras para o setor público, o desconto de 50% para estudantes pode ser considerado uma piada de muito mau gosto.
Nosso país é capitalista, tem uma das piores distribuições de renda do planeta, mas não podemos fugir da realidade de que tudo é pago, tudo tem um preço, desde o crachá que identifica o estudante ao ingressar na biblioteca da universidade à tinta da almofada usada para tirar a digital do analfabeto. Alguém sempre irá pagar o preço da meia entrada, ou do meio passe.
Para se proteger dos falsários, os produtores, proprietários de cinema e artistas aumentaram o preço dos ingressos, em até 100% em alguns casos. Os espectadores não estudantes e honestos passaram a pagar o dobro e os verdadeiros estudantes a pagar o preço que seria o do ingresso normal. Ou seja, ficou caro para todos.
Os falsários alegam que "se os preços fossem mais baixos, eu não falsificaria". Mas será que o preço subiu por causa dos falsários, ou os falsários apareceram porque o preço subiu? Afinal, quanto custa um par de meias?
Alguém tem que pagar pelo figurino, pelo cenário, pela manutenção da casa de espetáculo, pelo trabalho do autor, do diretor, da iluminação, da sonorização, pela manutenção do ônibus, pelo combustível, pelo trabalho do motorista, pelo investimento dos proprietários, enfim, alguém tem que pagar por cada átomo movimentado na máquina de fazer espetáculo ou de transportar pessoas.
Uma análise rápida de tais lutas pela meia entrada, ou pelo meio passe, nos leva a conclusão de que, ao mesmo tempo que os trabalhadores terão de pagar mais caro para andar de ônibus (porque são somente os trabalhadores que se deslocam de ônibus), os espectadores da classe média terão que pagar pela meia entrada para os estudantes.
Seria justo pedir que uma diarista que ganha R$50,00 para limpar uma casa, pague a passagem de ônibus para o estudante da FURB, ou da Univille? É justo que o ajudante de pedreiro ou o pintor de paredes pague para que o estudante do Ensino Médio vá para a escola localizada no centro da cidade, de ônibus, quando poderia estudar numa escola pública a menos de três quilômetros de sua casa?
O preço de um par de meias é o mesmo que do conjunto mínimo necessário para aquecer os dois pés de uma pessoa e nunca duas meias custarão o mesmo que um único pé. Alguém sempre terá que pagar o preço do par de meias, mesmo que leve para casa somente um dos pés. É o que acontece com a meia passagem, ou o meio ingresso.
É sabido que a planilha que determina o custo da passagem de ônibus é composta pelo conjunto custo de manutenção do sistema/quantidade de usuários pagantes. Ou seja, se alguém viaja de graça, os demais pagam a diferença.
No dia 12 de julho, a Rede Globo publicou em sua página na Internet, uma reportagem detalhada sobre a falsificação de carteiras de estudantes no país, antecedida pela comprovação de que é possível tirar via internet carteira de estudante até mesmo para Bin Laden.
É assustador pensar em estipular a meia entrada ou o meio passe estudantil, quando temos um país que ainda vive sob a lei de Gerson querendo tirar vantagem individual em tudo.
Infelizmente, o sentimento de coletividade, honestidade e principalmente, o respeito às leis e ao outro, passa ao longe de boa parte dos brasileiros . Novamente, os grandes prejudicados são os pobres, que pagam pelo par de meias, mas levam um único pé para casa, e sem reclamar.