Em pleno século XXI, o século em que os japoneses estão ligados em tempo real aos brasileiros, apesar de estarem do outro lado do mundo. Nestes tempos em que qualquer adolescente é capaz de entrar na internet e criar uma página pessoal, mostrando para o mundo o que pensa e faz, ainda há gestores escolares “colocando pressão” sobre os professores para que todos os alunos de uma mesma turma tenham notas superiores a sete.
Na mesma hora em que os profissionais dos recrutamentos das empresas procuram desesperadamente jovens que saibam ler, escrever, calcular e tenham o mínimo de autodisciplina e de capacidade de relacionar-se harmoniosamente com os demais membros de uma equipe de trabalho, para ocupar vagas ociosas há meses, há ainda diretores de escolas esquecendo que os pais são tão responsáveis pela aprendizagem dos filhos, quanto os profissionais da educação. E o pior, há professores que dão a tal nota aos alunos, independentemente deles terem aprendido ou não, só para não “se incomodar”.
Esta situação vem somente confirmar que o Brasil vive um período muito contraditório em se tratando de educação. No discurso e nos dados estatísticos, vivemos “num mar de rosas”. As pesquisas mostram números fabulosos. Entre estes números, a queda dos índices de repetência, o aumento do número de crianças e jovens em sala de aula, distribuição de uniforme, merenda, atendimento médico e odontológico, psicológico, escola aberta nos finais de semanas, amigos da escola atuando como se fossem professores...Tudo é tão lindo nas estatísticas internas da educação básica brasileira.
Enquanto isso... Nos testes internacionais, os estudantes brasileiros continuam entre os últimos colocados em desempenho. As empresas, cada vez mais, permanecem com vagas abertas sem perspectiva de preenchê-las a curto prazo. A nota mínima do ENEM para conseguir bolsa do PROUNI foi reduzida e a sociedade carece de pessoas que saibam efetivamente ler, escrever, calcular, raciocinar, pensar, responder aos desafios e, principalmente valorizar a escola.
Os licenciados formados nas faculdades já não querem ir para a sala de aula. Os adolescentes vão para a escola, em primeiro lugar, para encontrar os amigos, em seguida para, quem sabe, em algum momento, entre uma mensagem e outra no celular, ouvir um pouquinho daquilo que o professor está tentando dizer.
O professor, para estes adolescentes, tem a mesma importância e merece o mesmo tratamento do que o colega de sala. Mas se chegamos a esta situação é por uma única razão: a escola perdeu seu rumo e os próprios profissionais da educação deixaram de ensinar para algumas gerações, que a escola é o lugar de transmitir e apropriar-se do conhecimento científico. E foi com essa finalidade que a sociedade a criou.
O professsor, que é pago pela sociedade para ensinar, é tratado como se fosse peão de obra. E ainda tem que ouvir do diretor da escola que se as notas estão baixas, terá que se explicar com a secretaria. E tem mais a reclamação dos pais, o desgosto do aluno etc.
Havemos de chegar ao tempo em que a escola retomará seu lugar de espaço de trabalho profissional de ensino e aprendizagem.
A tal visitinha da supervisão da secretaria deveria ser, isto sim, para ajudar a encontrar solução para as dificuldades de aprendizagem dos alunos e auxiliar o professor a ensinar, tarefa cada vez mais tortuosa e violenta.
E para além deste aspecto, se o professor fosse operário braçal e dependesse somente de sua força física e determinação conseguir levar seus alunos a apropriar-se do conhecimento, a maioria quase absoluta dos estudantes aprenderia.
Entretanto, a apropriação do conhecimento pelo aluno depende mais dele próprio e do ambiente de estudo que tiver em casa, do que do professor. A motivação para aprender mais e sempre, é interna e independe do professor, da disciplina ou da diversidade de atividades em sala de aula.
A tal pressão sobre o professor faz parecer que os alunos e professores são máquinas. Chaplin já disse:sois homem e não máquinas. E se máquinas, todos estão com as engrenagens quebradas e não há mecânica conhecida para consertar a máquina da educação básica brasileira.
Nossas crianças e adolescentes precisam de boas notas, mas que sejam a expressão da realidade, da aprendizagem construída pela equipe pedagógica da escola. Ou seja, representem, verdadeiramente, a apropriação do conhecimento.
Caso não seja assim, se continuarmos pensando que a saída é pressionar professores, em vez de estudar e estabelecer estratégias, de cobrar dos alunos e dos pais que façam a parte que lhes cabe, passaremos mais uma década fazendo de conta que ensinamos com qualidade nas escolas brasileiras.
Afinal, a equipe pedagógica é montada para auxiliar o professor em sala de aula. E se recebe este nome é porque deve atuar em socorro ao professor desenvolvendo projetos que tornem o trabalho de ensinagem mais eficaz.
Enquanto a culpa do mal desempenho dos alunos estiver sendo jogada sobre as costas dos professores e professoras, já tão massagrados e violentados em sua dignidade profissional, esta roda viva girará e o Brasil continuará sem soluções.
A única saída será chegarmos ao tempo em que a autoridade do mestre em sala de aula seja reforçada pelo gestor da escola, pelos pais e por toda a equipe pedagógica da escola e das secretarias.