Nos últimos meses, a população brasileira foi chamada a participar de audiências públicas que discutiam os novos planos estaduais e municipais de educação.
O dia 24 de junho, era a data limite para estados e municípios adequarem suas leis ao Plano Nacional de Educação. O prazo instituito pela Lei Nº 13.005, de 25 de junho de 2014, ou o Plano Nacional de Educação (2014-2024) foi cumprido por menos de 50% dos municípios e estados, o que poderá levar o MEC a deixar de repassar verbas.
Entre os pontos que dificultaram a aprovação dos planos locais, está a questão de gêneros e, obviamente, a equiparação dos salários dos professores aos demais funcionários públicos com mesma escolaridade.
Somente esta equiparação, representa um reajuste de cerca de 60% no salário inicial da categoria, tomando por base o atual piso da categoria que é de R$1.917,78 e os salários de engenheiros e enfermeiros, publicados nos editais de concursos e ou processos seletivos para ingresso. Vale registrar que grande parte dos 5.570 municípios sequer paga o piso a seus professores.
Entre os estados, somente Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Amapá, Distrito Federal, Espírito Santo, Pará, Paraíba, Paraná e Pernambuco conseguiram aprovar seus PEE na data prevista pela lei.
A Secretaria de Estado da Educação de SC entregou à Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) o Plano Estadual de Educação, no dia 16 de junho. A expectativa é de que seja aprovado no segundo semestre.
O PNE prevê a valorização dos professores, o que também representa um empoderamento dos profissionais que atuam na sala de aula. Este empoderamento representa a perda de parte do poder e de influência dos gestores públicos sobre o processo pedagógico e, especialmente, sobre a gestão da escola e do conhecimento escolar.
Sabe-se que, quanto menor o sistema educacional (município ou estado), maior a influência político-partidária na gestão da escola e do saber de seus munícipes.
Ou seja, por traz das discussões dos novos planos de educação está a discussão das políticas públicas e, em última análise, da qualidade de ensino e de vida do cidadão.
O PNE prevê não somente a valorização dos professores, mas também a gestão democrática e técnica das escolas, empoderando os profissionais em efetivo trabalho na sala de aula. O que não interessa à grande maioria dos políticos que se perpetuam no poder sob o manto (e falso discurso) da “prioridade para educação”.
É fácil entender como chegamos ao “fundo do poço” quando se analisa a atual situação do ensino brasileiro em comparação com as demais nações pelo mundo afora. Quando se prioriza tudo: educação, saúde, criança, idosos, igualdade de gênero e raça, etc.. em verdade, não se está priorizando coisa alguma.
Há consenso de que a educação precisa ser a prioridade de uma nação. Mas não há ações nesta direção. A valorização do trabalho pedagógico e do professor que efetivamente consiga proporcionar ensino de qualidade a seus educandos é, portanto, a única saída para o Brasil mergulhado em crise econômica, moral, politica e administrativa profunda.
Pesquisas mostram que nossos professores estão cada vez mais doentes. O estresse, a depressão e um conjunto cada vez maior de síndromes decorrentes do excesso de trabalho, da falta de respeito não somente por parte dos alunos e pais, mas também dos colegas de trabalho e de gestores escolares, são a causa da maioria das doenças.
Diretores e diretoras despreparados para gerir a escola, especialmente no que se refere à indisciplina crescente dos estudantes (cada vez mais infantilizados e protegidos) e a ingerência política sobre os profissionais e o fazer pedagógico.
Estas ações externas, mas não desconectadas com a sala de aula resultam em síndromes caracterizadas por respostas e sentimentos negativos como a raiva e a depressão, geralmente acompanhadas de mudanças fisiológicas e bioquímicas potencialmente patológicas. São as chamadas doenças psicossomáticas que pioram no final do semestre ou ano letivo.
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) alerta que a categoria esta cada vez mais afetada pelo esgotamento mental. A vontade dos que estão em sala de aula é abandonar o ensino, numa tentativa de recuperar sua saúde. O número dos que abandonam a carreira por absoluta insatisfação com o resultado do trabalho aumenta a cada dia.
Tanto nas escolas da rede pública, quanto nas da rede privada, os professores têm dificuldade de identificar o que seja o efetivo exercício da categoria. Esta incapacidade de definir a própria profissão resulta no sentimento de desvalorização que os torna desanimados, irritados, cansados, exaustos. E, por fim, os impossibilita de ensinar com alegria, o que acaba se refletindo na falta de interesse de aprender nos alunos.
Os docentes reconhecem como causas desse quadro o baixo salário, a sobrecarga de trabalho, a desvalorização profissional por parte dos governos, direção da escola, alunos, pais e sociedade. E se o lazer pudesse minimizar esta situação de coisas, é desnecessário dizer que os baixos salários e excesso de trabalho extra-classe, excluem esta “válvula de escape”.
As relações difíceis e conflituosas nas escolas contribuem para o desconforto do professor. O fato de estarem assumindo papel de “babá-enfermeira”, de se sentirem exigidos demais pela direção e pais, de se sentirem uma espécie de “empregado doméstico”, como se o saber não fosse uma fonte de mediação entre ele e seus alunos deixa a sensação de que a doença inclui também a perda da “voz”. Então, calado, doente e sem perspectivas resta-lhe abandonar a sala de aula.
E se as discussões e os novos planos de educação não empoderarem o professor, atribuindo-lhe o poder de gerenciar não somente o conhecimento de seus alunos, mas também a própria vida financeira e saúde, descobriremos em breve que o poço em que o País mergulhou é mais fundo do que se poderia imaginar.