Mônica Lopes Gonçalves*
Os recentes acontecimentos que afetaram a região litorânea e o Vale do Itajaí, no Estado de Santa Catarina – enchentes e deslizamentos de encostas –, têm estreita relação com a delimitação das áreas de preservação permanente (APPs) que foram criadas para diminuir a ocorrência de riscos geológicos. No artigo 2º do Código Florestal Brasileiro – lei federal 4.771, de 1965 –, são ditas APPs, entre outras, as florestas existentes nas margens dos rios numa faixa cuja largura varia conforme a largura do rio. Para rios com até dez metros de largura, deve-se preservar permanentemente as florestas numa faixa de, no mínimo, 30 metros para cada lado. Para rios com largura entre dez e 50 metros, a APP deve ser de, no mínimo, 50 metros; para rios com largura entre 50 e 200 metros, a faixa de APP deve ser de 100 metros. Além dessas APPs, há de se destacar as encostas com mais de 45º de inclinação.
As faixas de florestas nas margens dos rios servem justamente para que, em épocas de grande precipitação pluviométrica, as árvores facilitem a infiltração da água da chuva no solo e diminuam a velocidade de escoamento das águas dos rios.
Na prática, o que se vê é a retirada dessa vegetação e, algumas vezes, construções são edificadas muito próximas às margens.
Na área urbana, nem se fala! Quase sempre se canaliza o rio e se constrói em cima dele ou junto à sua margem. Com o agravante que a sociedade em geral vê o rio como um receptor de esgotos e de lixo, em vez de ser fonte de água pura. Infalivelmente, as áreas mais afetadas nesses eventos naturais são as APPs. Essas ocorrências só se tornam catástrofes porque os homens constroem nessas áreas de risco geológico.
Justamente no projeto de lei 238/2008, do Governo de Santa Catarina, que trata do Código de Meio Ambiente do Estado está se propondo a redução dessas faixas para até cinco metros, numa forma de atender a alguns setores produtivos do Estado e que agora estão embaixo de lama.
Depois, quando as fortes chuvas testam os limites da racionalidade e do bom senso, se fala em reconstruir as cidades, as residências e as lavouras nos mesmos locais que são de risco geológico e que deveriam ser de florestas para prevenir perdas de vidas e de propriedades.
Quanto custará recuperar as áreas afetadas pelas enchentes? Quem paga a conta? A sociedade, é lógico! Mas quem é "beneficiado"? Alguns loucos que acham que podem "domar" a natureza.
Agora, vamos falar das encostas dos morros. Por que o limite de 45º de inclinação deve ser APP? Porque os estudos comprovam que, em épocas de chuvas intensas, os terrenos situados em encostas com essa inclinação ou superior a ela são mais suscetíveis de escorregar. Mesmo assim, se dá autorização para se construir nessas condições ou simplesmente não se fiscaliza.
Santa Catarina sofreu catástrofe similar a essa em 1983. Mas, infelizmente, passados 25 anos, as pessoas esqueceram ou achavam que aquele fenômeno anormal não iria se repetir. Mas a natureza não perdoa. Como diz o ditado, se você não pode contra o inimigo, alie-se a ele. Que mais essa catástrofe ensine de vez aos catarinenses que é melhor respeitar a natureza, perdendo um pouco de espaço da lavoura ou não construindo dentro das APPs, para salvar vidas e diminuir as perdas das pessoas.
*Doutora em recursos minerais e hidrogeologia