Foram mais de três horas de evento, com palavras e ações que emocionaram os participantes e a plateia. O grande momento foi o desfile, com pacientes amputados do Ramp. Estiveram na passarela Ana Paula Oliveira Braz; Aosmilda da Silva Rosa; Degmar Probst; Dionísio Ramilo; Elaine Cristina Duarte; Giovani Santos; Gustavo Ary da Roza; Izabel Luciane Canto Dussarrat; Luceane Muccelin; Maria dos Prazeres Goulart; Pedro Paulo de Souza; Protásio Anatólio Vicente; Samuel Virgilino dos Santos; e Vanderlei Bach.
Em depoimento para o público, Ana Paula disse que a experiência inédita que uniu Fisioterapia, Moda e Jornalismo "foi muito gratificante". "Os estudantes foram muito atenciosos, muito amorosos. Esse espaço que está abrindo essa semente que nasceu é formidável para todos nós. A acessibilidade da roupa é muito mais prática, porque a gente tem dificuldade em levantar, sentar, fechar um zíper. E eles proporcionaram uma coisa muito leve, muito boa para nós. Eu estou muito feliz, radiante, com a minha roupa, é espetacular", celebrou.
Para Giovani, que é o primeiro monitor voluntário do Ramp, o desfile foi "um momento mais do que especial na vida de uma pessoa amputada. Isto aqui é visibilidade. É sabermos que nós existimos de uma forma especial, principalmente para nossas famílias, para as pessoas, especialmente as do Ramp. É muito importante a gente estar aqui hoje na Assembleia Legislativa, é muito importante também o papel do poder público em fazer políticas sociais voltadas às pessoas com deficiência, apoiar nossos projetos".
Ele reforçou que o projeto da Udesc Cefid não traz somente reabilitação física, mas também emocional e pessoal, e elogiou também o trabalho de estudantes de Moda da Udesc Ceart na preparação das roupas.
"Foram atenciosos, prestativos e muito educados. Fizeram perguntas para mim sobre como eu gostava da roupa. Eu falei que não gosto de roupa presa, e fizeram essa roupa muito confortável. Essa questão do zíper [na lateral da calça] faz toda a diferença, vou levar sempre para a minha vida. Eu já tinha uma calça com zíper mais embaixo, agora vou fazer mais para cima porque facilita muito para quem usa prótese."
A fundadora da organização Bullock Inclusion, a empresária e ex-atleta de tênis em cadeira de rodas da seleção brasileira Samanta Bullock, trabalha com moda inclusiva há quase dez anos e enfatizou o poder da moda para vida de pessoas com deficiência.
"Até que ponto a moda pode trazer esse papel de facilitador e fazer com que a gente precise se adaptar menos e que isso esteja pronto para nos servir mais e mais? A Udesc está de parabéns, vai ser referência no Brasil, principalmente se continuar dando sequência a isso", refletiu Samanta.
Grande aprendizado no curso de Moda
Nos últimos meses, Samanta Bullock prestou tutoria a estudantes da disciplina de Moda e Sustentabilidade, da quarta fase do curso de graduação em Moda da Udesc Ceart, por meio de palestra presencial no Brasil e de mentoria online com grupos de alunos para auxiliar na produção de roupas adaptadas para os pacientes do Ramp usarem no desfile.
Na Udesc Ceart, a orientação foi feita pelas professoras Neide Schulte, coordenadora do programa de extensão Ecomoda, e Gabriela Kuhnen. "Trazer isso [a moda inclusiva] para uma disciplina do curso é muito importante porque todos os alunos terão a oportunidade de trabalhar com moda inclusiva", disse a professora Neide. "Que o desfile seja um primeiro trabalho em conjunto e que a gente possa, todos os anos, estar trazendo as criações."
Para a docente Gabriela, o desfile foi "um grande aprendizado para nós, professoras, e principalmente para os alunos. A gente viu a transformação que aconteceu nos alunos, de poderem desenvolver um projeto de moda inclusiva para pessoas reais".
"São alunos de quarta fase. Então, é a primeira vez que eles fazem um projeto de desenvolvimento de produtos de moda do início até o fim. E a gente fez um projeto de moda inclusiva. Esses alunos estão super à frente se a gente for pensar nesse sentido. Eles conversaram com os modelos, os pacientes do Ramp, e entenderam quais eram as necessidades de cada um, como era para se locomover, para se vestir, qual era o maior impedimento, e, a partir disso, foram buscar soluções", frisou Gabriela.
Além da parte social, ela destacou os aspectos ambientais envolvidos na produção da coleção para o desfile. "A gente trouxe a parte de economia circular e a gente trabalhou com upcycling [reciclagem]. O que é o upcycling? É a gente desenvolver novos produtos a partir de peças que estão sendo descartadas ou são peças de segunda mão, de brechós. Além de algumas peças que foram doadas por empresas, que são peças que têm algum defeito de qualidade e seriam jogadas no lixo, mas são peças novas e boas, a gente transformou isso."
Comunicação comunitária e integração
Duas das atrações do Desfile Amputação em Movimento - Moda e Inclusão, a mostra fotográfica e a versão inicial do documentário "Amputação em Movimento" (assista ao vídeo), foram produzidas por estudantes do projeto de extensão Jornalismo e Ação Comunitária (JAC), coordenado pelas professoras Melina de la Barrera Ayres e Isabel Colucci Coelho, do Departamento de Jornalismo da Ufsc.
"A gente parte do princípio de uma comunicação que é comunitária, de fazer comum. E é dentro desse fazer comum, de quem conta e é contado participarem do processo de construção de uma narrativa, que nós nos integramos ao projeto e fomos muito exitosos enquanto coletivo. A partir desse comum, a gente conseguiu olhar para a deficiência a partir de um novo lugar, de potência, potencialidades, possibilidades, de narrativas e de vida", celebrou a professora Melina, que também destacou a integração interdisciplinar e interinstitucional para a realização do desfile.
"A gente tem a Ufsc e a Udesc trabalhando juntas para entregar algo para a sociedade muito maior do que a gente conseguiria fazer se fizesse isoladamente. Esse dar as mãos, esse comum, é o grande diferencial desse projeto", afirmou a docente.
A professora Isabel também reforçou o potencial dessa ação inédita. "Quando a gente ia explicar o que a gente estava fazendo, as pessoas achavam inusitado quando a gente começava a dizer que era um projeto do Jornalismo, da Moda e da Fisioterapia. É muito rico ver tudo isso combinado fazendo tanto sentido."
O Vozes que Não Calam também prestou uma homenagem à Adriana Maria Aparecida, que era paciente do Ramp e integrante do coral e faleceu em janeiro deste ano, com a apresentação de uma música sobre amizade, "Canção da América", de Milton Nascimento.
"Numa versão um pouquinho mais animada, assim como era a Adriana, sempre alto-astral, sempre alegre, sempre para frente", disse o coordenador do coral, maestro Ramon Pereira da Silva, ao público. Esse projeto de música é promovido gratuitamente para mulheres desde 2018 pela Prefeitura de Florianópolis, por meio da Guarda Municipal.
Vidas em movimento
No seu discurso, a coordenadora do Ramp, professora Soraia Tonon da Luz, disse que "o que estamos vivendo hoje representa muito mais do que moda, arte ou técnica. Representa vidas em movimento. Quando eu tinha apenas 14 anos, a minha vida, e de minha família, mudou. Meu irmão, ainda uma criança, sofreu uma amputação. E, naquele momento, eu descobri algo que, até hoje, ecoa dentro de mim: a força de uma família quando o inesperado rasga o cotidiano. Descobri o medo, a insegurança, o julgamento de uma família, a angústia e, sobretudo, o peso do olhar social, esse que, muitas vezes, machuca mais do que a própria amputação".
"Mas também descobri algo maior: a coragem. A coragem de uma criança que olhava para mim e dizia 'Eu me adapto, mana'". Essas três palavras ficaram gravadas no meu corpo, na minha mente e na minha alma. Elas se tornaram, anos mais tarde, a semente do método Me Adapto. Um método que criei e reconhece a reabilitação não apenas de forma física, mas também emocional, humana, espiritual e essencial. Um método que nasceu da dor, mas que floresce com propósito", destacou.
Criado em 2012, o Ramp tem atividades que incluem atendimentos presenciais na Udesc Cefid, no Bairro Coqueiros, em Florianópolis, e online para pessoas amputadas, além de grupo de estudos e seminário científico.
O atendimento é voltado a pessoas que sofreram amputação de membros e necessitam de reabilitação tanto no ambiente hospitalar quanto no ambiente ambulatorial, antes ou depois de começar a usar a prótese.
A ação da Udesc Cefid, que atende cerca de 50 pessoas a cada semestre, promove a atenção à saúde dos participantes de forma humanizada e buscando o cuidado integral, com avaliações físico-funcionais, avaliações biomecânicas e atendimento específico individual e em grupo.
No desfile, a professora Soraia ressaltou que "o Ramp acolhe pessoas vulneráveis, atravessadas por dores, perdas, medos e histórias interrompidas. E a nossa missão vai muito além de dar funcionalidade física após a protetização; vai muito além de florescer o sorriso; vai muito além de escutar. Reabilitar é vibrar por cada milímetro de conquista, mesmo aquele que ninguém mais vê. Reabilitar é acreditar que sempre existe um caminho e que esse caminho precisa ser construído junto".
"As barreiras de acesso à reabilitação plena no nosso estado e no nosso país ainda são imensas. Enfrentamos itinerários terapêuticos fragmentados; listas de espera que atrasam e dificultam o acesso à prótese adequada; ausência de serviços integrados desde o pós-operatório imediato e, muitas vezes, há faltas de equipes multiprofissionais capacitadas para acolher, avaliar e acompanhar essas pessoas como elas merecem", acrescentou a docente no seu discurso.
Diante desse cenário, o Ramp não para de receber novas demandas, de diversas cidades. "São famílias buscando orientação, pacientes vulneráveis pedindo apenas a chance de recomeçar. E nós, como instituição pública de ensino, carregamos uma missão dupla: formar alunos, mestrandos e doutorandos com excelência científica, mas, ao mesmo tempo, servir à comunidade com responsabilidade social. Mas, para tudo, existe um limite. Somos extensão, propósito e vida em movimento, mas não podemos assumir uma demanda que é estadual, social e nacional. E isso dói. Dói porque vemos de perto o impacto da espera, o atraso funcional, as complicações evitáveis e a perda de autonomia e de esperança", comentou a professora Soraia.
Ciência a favor da reabilitação
A docente reforçou, no evento, que "mesmo diante das limitações, acreditamos profundamente que a reabilitação é um direito, não é um privilégio. E que ciência, gestão pública, tecnologia e políticas integradas podem, sim, transformar esse cenário".
"Absolutamente nada disso seria possível sem a universidade pública. Nada disso seria possível sem a equipe Ramp, que faz acontecer todos os dias. Que sustenta, sonha, cria, acolhe, pesquisa e transforma. E, acima de tudo, nada seria possível sem os nossos pacientes, que nos ensinam com cada passo, cada tentativa, cada silêncio, cada sorriso, cada queda e conquista, o verdadeiro significado de resiliência, coragem e humanidade. Eles nos mostram diariamente por que precisamos seguir", apontou a professora Soraia.
A união entre os cursos de Fisioterapia, Moda e Jornalismo também foi celebrada pela docente. "Este evento mostra algo poderoso: que a inclusão floresce quando diferentes áreas se encontram. Quando moda, fisioterapia, jornalismo e comunidade se olham, se escutam e criam juntas. Hoje, vivenciamos o que verdadeiramente significa o trabalho interdisciplinar em seu mais profundo contexto dentro e fora da universidade. Aqui, desafiamos estigmas, mostramos que muitas limitações estão mais nos olhos da sociedade do que nos corpos das pessoas amputadas. Aqui, reafirmamos uma verdade que move tudo que fazemos: diversidade é potência, ciência é caminho e pertencimento é cura. Se este evento transforma vidas, e ele transforma, é porque escolhemos caminhar lado a lado, com conhecimento, responsabilidade e, acima de tudo, amor ao próximo."
No término do seu discurso, Soraia agradeceu aos gestores da universidade e da Udesc Cefid e às equipes do Ramp e do Laboratório de Biomecânica, em especial à técnica universitária Juciane Abreu, pelo apoio na realização do desfile.
Diversas autoridades
O evento foi prestigiado pela vice-reitora da Udesc, professora Clerilei Bier, que representou o reitor da instituição, professor José Fernando Fragalli. "A Udesc pretende, através desse projeto, dar mais acessibilidade e empoderamento a essa causa", declarou a vice-reitora.
A diretora-geral da Udesc Cefid, professora Suzana Matheus Pereira, destacou que o Ramp visa a reabilitação e a inclusão através do movimento, "que é a vocação do Cefid, de trabalhar com esporte e saúde nas nossas 170 ações de extensão".
O desfile também foi prestigiado por:
Técnico Ismael Franz, diretor de Administração da Udesc Cefid;
Professor Sérgio Henrique Pezzin, pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Udesc;
Professor Lucas da Rosa, diretor-geral do Centro de Artes, Design e Moda (Ceart);
Professor Marino Luiz Eyerkaufer, diretor-geral do Centro de Educação Superior do Alto Vale do Itajaí (Ceavi);
Médicos Marcelo Lemos dos Reis e André Sobierajski dos Santos, que são diretores do Centro Catarinense de Reabilitação (CCR) e representaram o secretário estadual da Saúde, Diogo Demarchi;
Assessor Renan Canello, que compareceu em nome do deputado estadual Alex Brasil, designado para representar o presidente da Alesc, deputado Julio Garcia;
Empresário Silvio Alexandre Zancanaro, suplente de deputado estadual e autor do Projeto de Lei nº 411/2024, que prevê o estabelecimento da Política Estadual de Reabilitação Integral da Pessoa Amputada em Santa Catarina;
Assessora Paula de Abreu Pereira, representando o gabinete da deputada estadual Luciane Carminatti;
Psiquiatra Adriana De Souza Kuchenbecker, representando a coordenadora de Saúde Mental da Prefeitura de Florianópolis, Cristina de Souza;
Assessor Rafael Coimbra, da área de Políticas Públicas para Pessoa com Deficiência da Prefeitura de Florianópolis, representando o presidente da Câmara Municipal, vereador João Cobalchini;
Prefeito de Laguna, Peterson Crippa;
Assessora Regiane Marlene Dias, da área de Responsabilidade Social da Celesc, representando a presidência da companhia;
Assessor Adriano Ribeiro, do Instituto Otovida;
Engenheiro Wladimir Mazzolla Morais, presidente do Rotary Club de Florianópolis.
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