Palestrantes Modesto, Resende, Kita e Heronaldo. FOTO: Gleber Pieniz
Foi intenso o Fórum das Engenharias realizado nesta quinta-feira na Udesc Joinville e transmitido pelo
canal do CCT no YouTube. Promovido em parceria entre a Universidade do Estado de Santa Catarina e a Universidade Federal de Santa Catarina, o evento reuniu dirigentes, professores, alunos e egressos para debater a formação dos engenheiros e a relação com o mercado de trabalho. Ao fim do encontro, ficou definido que a experiência terá continuidade, com novas edições semestrais do fórum.
O diretor-geral da Udesc Joinville, Leandro Zvirtes, abriu os trabalhos agradecendo ao “trio de mulheres” que fez o evento acontecer: as professoras Julice Dias, pró-reitora de Ensino; Gelcemar Farias, coordenadora de Ensino de Graduação da Proen; e Fabíola Viel, diretora de Ensino de Graduação do CCT. Leandro enfatizou a pertinência do tema do fórum: “A formação de engenheiros está no centro de um debate global sobre o papel das universidades frente a um mundo em constante transformação”. Ele também aproveitou para atualizar os números do centro: 2.050 alunos matriculados na graduação, 530 alunos na pós-graduação, sendo que somente nos quatro cursos de engenharia são 1.160 estudantes ativos. E o número de engenheiros formados nos 60 anos do CCT, segundo o diretor, está chegando na casa dos 7.050. Na Udesc como um todo existem 14 cursos de engenharia.
Antes de encerrar, o diretor-geral fez o anúncio do resultado de dois editais da Finep, que contemplou Udesc e UFSC com um total de R$ 245 milhões. O maior projeto envolve as duas universidades e o centro de pesquisa da Wetzel, para o qual foi alocado R$ 151 milhões. Os restantes R$ 94 milhões são destinados ao centro automotivo da Walbert.
Em seguida, a pró-reitora Julice fez uma breve intervenção para deixar uma questão-chave aos palestrantes convidados que a sucederiam: “O que é aula? Ainda é o emparedamento dos estudantes nas salas e laboratórios? Ou temos conseguido alargar a nossa compreensão do que é aula e desemparedar tanto docentes quanto estudantes no dia a dia do ensino de graduação?”
Por parte da UFSC, a saudação foi feita pela pró-reitora de Graduação e Educação Básica, Dilceane Carraro, que representou o reitor Irineu Manoel de Souza. Ela agradeceu o convite da Udesc para mais essa parceria e disse que a iniciativa contemplou o desejo antigo de realizar um debate mais amplo sobre a formação das engenharias, já que a UFSC oferece 26 cursos dessa área em todo o estado. “Assim como a Udesc, a UFSC tem muito orgulho da formação de engenheiros que estão pelo país e pelo mundo contribuindo para o desenvolvimento”, disse Dilceane. Ao mesmo tempo, manifestou preocupação com a queda no número de matrículas: “Em 2015 o país tinha 1 milhão e 250 mil alunos matriculados nos cursos de Engenharia, e os números mais recentes mostram 890 mil”. O caso mais grave, segundo ela, é o da Engenharia Civil, que teve uma redução de 50%. A pró-reitora ainda elencou o desafio das vagas ociosas e da evasão, lembrando de que é preciso combater o mito de que Engenharia é um curso “de matemática” e acessível "só para quem é muito bom em exatas".
O reitor da Udesc, José Fragalli, falou na sequência. Lembrou que há cerca de sete anos participou de uma colação de grau de 150 engenheiros no CCT, e que no mês passado apenas 60 engenheiros colaram grau neste campus. Fragalli chamou atenção para o aspecto externo à universidade nessa crise das Engenharias: a persistente má formação em matemática dos jovens brasileiros, sobretudo no Ensino Médio. Isso se reflete, segundo o reitor, não só na baixa procura por esses cursos, mas também na alta evasão já nos primeiros anos, quando a reprovação chega a atingir o índice de 80%, em alguns casos.
Palestrantes
O primeiro palestrante do Fórum das Engenharias foi o professor Heronaldo de Sousa, ex-diretor-geral do CCT e ex-reitor da Udesc. Ele começou mostrando dados positivos sobre a profissão. Em um gráfico, relacionou a engenharia com a riqueza da sociedade — a proporção entre o número de engenheiros e o PIB dos estados brasileiros fica visível. E a recente pesquisa Quaest/Confea aponta que 92% dos engenheiros formados no Brasil está trabalhando, 78% deles atua na área de formação e 80% estão contentes com sua qualidade de vida.
Por outro lado, Heronaldo apresentou também a queda constante no número de engenheiros formados: de 127 mil em 2019 para 95,6 mil em 2023. Citando o Confea, o ex-reitor disse que a expectativa é de déficit de 1 milhão desses profissionais em 2030. Uma das causas, segundo o professor, é a expansão desordenada do sistema de educação à distância no Brasil. Isso leva a universidade pública a adotar novas estratégias: saiu da fase de selecionar alunos por meio do vestibular, passou a captar candidatos com ações de marketing e agora está na fase de prospectar potenciais acadêmicos. Ele dá o exemplo do programa CientifiCIDADE, da Udesc, como um modelo de prospectar estudantes.
Na sequência das palestras, o presidente do Crea-SC e egresso da UFSC Carlos Alberto Kita Xavier apresentou dados da entidade relacionados à profissão: 82 mil profissionais registrados, 23 mil empresas cadastradas, foco na fiscalização mais orientativa e menos punitiva, com baixo número de multas. Informou que o Crea de Santa Catarina é o que tem mais ART por profissional registrado, e que o Brasil tem 5,5 engenheiros para cada mil habitantes, enquanto nos países desenvolvidos essa relação é de 23 por mil. Kita também comparou a formação entre as áreas: um engenheiro para cada 11 profissionais da área de humanas, ao passo que nos Estados Unidos a proporção é 1 para 3.
Terceiro palestrante do dia, o professor Luis Mauricio Resende manifestou a alegria de voltar a sua “alma mater”, pois formou-se em Engenharia Mecânica na Udesc, e também por participar de um evento em parceria com a UFSC, onde fez seu doutorado. Hoje ele atua no Instituto Técnico Federal do Paraná, onde 60% dos 30 mil alunos cursam Engenharia. De início, Resende avisou que iria centrar sua fala na universidade e não na sociedade, ou seja, focar na formação do engenheiro.
No slide de abertura, o professor colocou lado a lado dois imperadores: o romano Nero e o francês Napoleão. Então propôs uma hipótese: “Se a gente imaginar uma viagem de Nero a Paris ou de Napoleão a Roma, esses dois imperadores, separados por 18 séculos, iriam usar o mesmo meio de transporte, teriam o mesmo tempo de viagem, passariam por estradas construídas com a mesma técnica, vestiriam roupas feitas com tear manual. Então temos aí 18 séculos em que nada mudou em termos tecnológicos”.
Quando passa ao segundo slide, Resende mostra graficamente a aceleração do crescimento tecnológico. Uma “reta de baixíssimo coeficiente angular” perdura por séculos, até o momento de inflexão no pós-guerra, quando a reta vira uma “exponencial com coeficiente bastante elevado”, revelando mudanças tecnológicas intensas a cada década. Assim, segundo ele, vivemos três grandes eras cognitivas: a oral, em que todo o registro do conhecimento e da cultura tinha a memória como suporte; a escrita, cujo suporte foi o papel, graças à invenção da imprensa por Gutenberg e à chegada da técnica oriental de fabricação de papel com fibra vegetal; a era digital, com suporte no computador.
“Na era oral, a pessoa é importante, o ancião é importante. Na escrita, é o lugar, é a biblioteca. Na era digital, é o computador, mas nem é meu computador, porque tudo está na nuvem. Até os anos 2000 a biblioteca era o locus da aquisição de conhecimento, a sala de aula era o locus da aquisição de conhecimento. Quando a gente digitaliza tudo, que informação é inédita? O que o aluno escuta em sala de aula que não existe na internet?”, questionou.
O palestrante elencou algumas ideias para enfrentar esse novo paradigma, afirmando que, no conjunto, elas podem ser qualificadas como “inovação disruptiva”, que “doem muito”, pois perpassam currículo, metodologias, sistemas e modelos de ensino.
O encerramento da fase de palestras ficou com o professor da UFSC Modesto Hurtado Ferrer. Ele abordou a sua experiência pessoal como docente e como gestor em algumas organizações empresariais, enfatizando a necessidade de a academia formar um profissional mais completo, apto para atuar no que chama de nova economia. Para além das competências técnicas, Modesto citou a demanda por competências socioemocionais e uma cultura empreendedora.
Na parte da tarde, o Fórum foi dedicado à troca de experiências com egressos da Udesc e da UFSC. E depois de uma manhã bastante crítica à universidade, em que se esmiuçou vários pontos de desconexão do ensino com o mundo do trabalho, o relato dos egressos caminhou no sentido contrário, devolvendo ânimo aos professores. De modo geral, os ex-alunos destacaram a boa formação que tiveram e trouxeram exemplos de desafios profissionais superados graças ao conhecimento obtido durante o percurso acadêmico.
Como último ato do Fórum, as pró-reitoras Julice e Dilceane apresentaram uma síntese das discussões. E o grande desafio, elas concordaram, é o trabalho de formação de professores. “O ato de aprender”, resumiu Dilceane, “não é consequência imediata do acesso à informação. Ele precisa ser mediado”. Para dar continuidade a esse processo, mais edições do Fórum das Engenharias serão organizadas.
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